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Olavo de Carvalho elogia Suplicy e diz que trabalharia até com Satanás pelo Brasil
Tido como polo ideologicamente oposto ao vereador petista Eduardo Suplicy, o filósofo Olavo de Carvalho afirmou que aprova a ideia da renda básica da cidadania, projeto do petista que propõe renda mínima a todos os cidadãos, e que trabalharia com o petista para aprimorá-la.
“Suplicy é um sujeito muito simpático e a ideia dele não é ruim, que todo mundo tenha uma renda”, disse Carvalho em entrevista exclusiva à BBC Brasil na Universidade Harvard, em Massachusetts (EUA). “Claro, todo mundo quando nasce tem que ter alguma coisa.”
Para o filósofo, expoente da nova direita brasileira, o maior desafio do projeto é definir quem poderá financiar esta renda mínima.
“A renda básica moralmente está certa. Mas ela não adianta se não se especificar quem tem que dar esse dinheiro e de onde tem que sair”, disse.
Questionado pela reportagem se ajudaria o petista no aprimoramento da proposta, Carvalho não hesitou. “Trabalharia com o Zé Antonio, com o Satanás se for preciso. O que a gente não faz para melhorar o Brasil?”
O encontro inusitado aconteceu na manhã desta sexta-feira durante a Brazil Conference, megaconferência organizada pela Universidade Harvard e pelo MIT (Instituto de Tecnologia de Massachusetts).
Renda universal
Suplicy e Carvalho participaram de debate sobre reformas sociais e desenvolvimento no Brasil.
Ao lado dos dois, estava o cientista politico brasileiro Hussein Kalout, secretário especial da Secretaria de Assuntos Estratégicos do governo Temer, e do moderador Pedro Henrique de Cristo, mestre em políticas públicas pela Universidade Harvard.
Suplicy citou a renda básica da cidadania em todas as suas respostas. O projeto propõe uma renda mínima para todos os cidadãos, ricos e pobres, inclusive estrangeiros que vivam no Brasil há mais de cinco anos.
“Enquanto eu estiver vivendo, vou lutar pela aplicação da renda básica universal no Brasil”, disse o ex-senador de 75 anos.
Bem-sucedido no Alasca (EUA), que após 34 anos de programa passou de Estado mais desigual do país para um dos mais igualitários, o projeto proposto pelo petista seria financiado a partir dos impostos recebidos por União, Estados e municípios.
Neste ano, a Finlândia começou a testar a iniciativa com um grupo de 2 mil pessoas – o valor é de 560 euros (R$ 1,9 mil) mensais. Caso o projeto-piloto seja bem-sucedido, a ideia é expandir o benefício a toda a população.
Para os críticos, entretanto, o problema do projeto no Brasil seria o seu financiamento. Opositores argumentam que a carga tributária no país é alta e que não haveria como garantir a renda básica sem aumento de impostos.
Em janeiro de 2004, o Brasil sancionou a lei que institui a Renda Básica de Cidadania proposta por Suplicy. Desde então, entretanto, o vereador aguarda que ela seja regulamentada para entrar em vigor.
Educar a elite
Durante suas falas, o filósofo Olavo de Carvalho criticou o sistema de ensino brasileiro e disse que não adianta pensar na educação de crianças e adolescentes se os professores não tiverem uma formação consistente.
“Primeiro tem que formar o agente para que a ação (de educar) seja possível”, disse.
Na opinião dele, “os professores hoje não são capazes nem de discernir os conteúdos que vale a pena se transmitir e os que não valem. E hoje acham que todos os conteúdos valem a mesma coisa. Não valem”.
“Se os próprios intelectuais insistem em nivelar essas coisas, então o conceito de educação acabou”, argumenta o filósofo, que completa: “Quem vai educar o povo é a própria elite, então temos que educá-la primeiro”.
A BBC Brasil perguntou se os alunos precisarão esperar que os professores passem por uma reciclagem para que tenham acesso à educação.
“Quem você tem que formar primeiro, o médico ou o doente? Adianta dar um curso de medicina para o doente? É o que está acontecendo no Brasil. Privilegiar primeiro a educação popular e depois a da elite é totalmente absurdo porque, quem vai educar o povo? É a própria elite. Não dá para fazer as duas coisas ao mesmo tempo, estes jovens já estão tendo a pior educação possível.”
Despolarização
A Brazil Conference, palco do encontro, acontece nesta sexta e sábado nos corredores de Harvard e do MIT, com mais de cem palestrantes e moderadores.
Autoridades como a ex-presidente Dilma Rousseff, o juiz federal Sérgio Moro, os ministros do Supremo Tribunal Federal Gilmar Mendes e Luís Roberto Barroso e a ex-senadora Marina Silva participarão de mesas redondas e entrevistas.
A lista de convidados também inclui Armínio Fraga, ex-presidente do Banco Central, Deltan Dallagnol, procurador da operação Lava Jato, Alessandro Molon, deputado federal pela Rede, e personalidades como o apresentador Luciano Huck, o jogador Kaká e os músicos Gilberto Gil e Yamandu Costa, entre muitos outros.
O objetivo da conferência, segundo os organizadores, é aproximar polos opostos.
“No Brasil, a direita e a esquerda simplesmente não conversam”, disse o pesquisador David Pares, um dos presidentes da Brazil Conference, no início da semana.
“As pessoas só compartilham o que já acreditam. Entendemos isso como falta de diálogo entre ideais diferentes e esse é o maior problema da polarização. A ideia da conferência é ajudar as pessoas a desmistificarem o polo oposto”, afirmou.